quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

É FÁCIL GOVERNAR O BRASIL

Alexandre Aragão



No seu discurso proferido em Salvador, no dia 29 de dezembro corrente, na cerimônia de entrega de moradias a cidadãos e cidadãs soteropolitanos, o Presidente Luís Inácio Lula da Silva fez uma afirmação contundente: “É fácil governar o Brasil”, desmistificando e desmascarando toda a onda de preconceitos e articulações produzidos por setores da elite conservadora brasileira que torciam nesses anos pelo desastre da administração de trabalhadores a frente do executivo federal.

A centralidade da afirmação do Presidente Lula alicerça-se, segundo seu pensamento, em dois pontos básicos. Primeiramente no fato de, ao ter alcançado o topo máximo da direção política do País, nunca haver esquecido suas origens, o agreste pernambucano de onde teve de emigrar para a capital paulista na busca de sobrevivência digna. O outro pilar de sustentação de sua ciência política foi o claro objetivo pelo qual se arvorou à Presidência da República: ser um legítimo e fiel representante da maioria do povo brasileiro e não de uma minoria que historicamente detém o poder econômico deste País.


O método adotado neste percurso pode ser resumido em poucas palavras: a articulação do crescimento econômico, do controle da inflação e da redução das desigualdades sociais com uma vigorosa e inovadora participação social na implementação de políticas públicas, buscando construir uma nova relação entre Estado e Sociedade, conferindo efetividade aos princípios da democracia participativa previstos na Constituição Federal de 1988.

De fato, na primeira Mensagem enviada ao Congresso Nacional, o Presidente da República anunciou a participação social como método de governo. Em 1° de janeiro de 2003, ele redefiniu as atribuições da Secretaria-Geral da Presidência da República, que passou a ser responsável pelo diálogo do Governo com a sociedade civil. Coube à Secretaria-Geral coordenar a constituição de espaços e instrumentos participativos, bem como a formulação de conceitos e procedimentos que passaram a orientar os órgãos de Governo em sua interação com os movimentos sociais e entidades da sociedade civil.

Iniciou-se, então, uma mudança completa no modo de elaborar as políticas públicas e, consequentemente, na forma de implementá-las e avaliá-las.

A partir de 2003, elas passaram a ser debatidas em conjunto com a sociedade civil nas conferências nacionais, nos conselhos, fóruns, mesas de diálogo e ouvidorias. As conferências adquiriram um caráter inovador, com a realização de etapas municipais e estaduais, culminando em uma etapa nacional, e permitiram aos mais variados segmentos da sociedade civil expressarem suas demandas e propostas.

As 73 conferências nacionais realizadas entre 2003 e 2010 mobilizaram diretamente mais de cinco milhões de pessoas em inúmeros municípios brasileiros. Diversas políticas públicas foram objeto de debate, tais como: desenvolvimento, geração de emprego e renda, inclusão social, saúde, educação, meio ambiente, direitos das mulheres, igualdade racial, reforma agrária, juventude, direitos humanos, ciência e tecnologia, comunicação, diversidade sexual, democratização da cultura, reforma urbana e segurança pública, entre muitas outras.
 
Nestes oito anos, diversos conselhos foram criados, tais como: Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial, Conselho da Transparência Pública e Combate à Corrupção, Conselho Nacional de Combate à Discriminação, Conselho das Cidades, Conselho Nacional de Segurança Pública, Conselho Nacional de Juventude, Conselho Nacional de Economia Solidária, Conselho Nacional de Aquicultura e Pesca, entre outros. Muitos foram inteiramente reformulados e democratizados, por exemplo: Conselho Nacional dos Direitos do Idoso, Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência, Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável, Conselho Nacional de Saúde, Conselho Nacional do Meio Ambiente e Conselho Nacional de Recursos Hídricos, entre outros.


Segundo Paulo Freire, os condicionamentos culturais sobre os quais foi formado o Brasil forjaram uma sociedade colonial, fechada, escravocrata, reflexa, sem povo, antidemocrática, rigidamente autoritária. Nossa formação histórica não criou condições para que o nosso povo pudesse construir-se pelas próprias mãos, porque entre nós o que predominou foi o mutismo do homem, devido à sua não-participação na solução dos problemas comuns imposta pela elite governante. Para Freire, o que caracterizava a sociedade brasileira era sua condição pré-política.


Com Lula inaugura-se uma nova fase de nossa história: a da democracia participativa. O povo começa a ter voz em espaços públicos de deliberação política.


A participação política pode ser considerada como um instrumento de transformação social com potencial para educar, transferir poder e socializar os atores participantes. A participação política funciona como uma escola onde os cidadãos adquirem uma compreensão sobre o que os governos fazem, sobre o que os governos não podem fazer e sobre como eles, os cidadãos e cidadãs, podem apresentar seus interesses e demandas para os representantes públicos. Setores excluídos da população, frequentemente destituídos de poder, têm a oportunidade de participar diretamente da elaboração de propostas políticas que vão influenciar sobre seu futuro.


A participação dos cidadãos comuns nas decisões de governos é um momento ímpar, um divisor de águas na política brasileira. Essa é uma das grandes inovações do Governo Lula, uma herança da qual é preciso saber cuidar.


sábado, 18 de dezembro de 2010

A NOVIDADE DO NATAL

Alexandre Aragão


Neste período, apesar do frenesi das ruas e vitrines lotadas de apelos consumistas, temos sempre a possibilidade de parar para refletir um pouco em torno de nossa caminhada como humanidade.

Dezembro é um mês recheado de simbologia, principalmente por suas datas comemorativas, que vai culminar, no mundo ocidental, com a data das datas: o nascimento de Jesus de Nazaré, um jovem carpinteiro que veio apresentar ao mundo uma nova proposta de vida.

Se o desenho da sociedade política de então pode ser representado por uma pirâmide, onde no seu ápice estava o soberano – faraó, rei ou imperador -, detentor de todo poder (uma espécie de “legítimo” representante de deus na terra), e na sua base estava o povo que não possuía um valor, depois de Jesus esta configuração muda. Com a sua revelação de Deus como o Ser que ama a todos os seus filhos e filhas sem distinção, homens e mulheres passam a ser herdeiros, possuidores de realeza em si mesmos pelo simples fato de serem humanos.

Para isso, o jovem carpinteiro coloca em questão valores e procedimentos da Lei mosaica, com atitudes desconcertantes: começa a visitar os publicanos em suas casas; a dialogar com leprosos, prostitutas, estrangeiros e crianças; distribui pães e peixes com os despossuídos; realiza atividades de cura em dia de Sábado, que era a expressão máxima da Lei; anuncia abertamente, em alto e bom tom, que a vida deve ser plena para todos os seres humanos e não apenas para alguns.

Ou seja, começa a colocar novas bases culturais para a construção de uma nova ordem onde todos os homens e mulheres sejam tratados com a mesma dignidade de filhos e filhas do Deus-Amor por ele anunciado.

O jovem carpinteiro, portanto, era portador de uma nova visão de mundo que desestabilizava a visão hegemônica juntamente com aqueles que dela se beneficiavam.

Ele vai mais além: o seu Deus não está distante, mas presente no meio da humanidade reunida em seu nome. De fato lê-se nos evangelhos: “onde dois ou mais estão unidos em meu nome, Eu estou no meio deles”. Portanto, com essa afirmação, Jesus sinaliza para um novo desenho de organização política e social. Não mais piramidal, mas circular, onde a expressão do poder soberano é o resultado da fraterna solidariedade amorosa que circula entre os membros da comunidade humana.

A experiência de vida de Jesus de Nazaré sustenta sua afirmação. Ele não nasceu num palácio imperial, mas numa manjedoura, após haver sido rejeitado pelas hospedarias. Rodeado pela Natureza, e por aqueles que dela cuidam e que com ela realizam sua trajetória existencial (pastores e agricultores), apresenta uma ecologia amorosa como modelo de organizar a vida na terra.

Ele não se coloca acima, mas ao lado da humanidade, em suas dores e realizações: como exilado no Egito, como filho ajudando seus pais no trabalho de carpintaria, como mestre demonstrando com sua reflexão uma nova forma de pensar o mundo. Viveu com absoluta convicção sua fé na revolução de que é capaz o amor, ao ponto de ser condenado pelo modelo piramidal de então.

Na cruz [a pior das condenações] visitou o “último lugar”, igualando-se aos marginalizados, empobrecidos e oprimidos. E no momento extremo de sua vida, sentiu-se abandonado pelo seu Deus. Mas ao entregar seu espírito nas mãos de Dele, realiza plenamente a lógica do amor que vai além de medidas racionais.

Em seu último ato livre mostra ao mundo que a recomposição de qualquer unidade é um ato que requer a capacidade de perdoar sempre. Nele e com ele nasce uma fraternidade verdadeira, porque viveu até o fim aquilo que anunciou.

O exemplo e a mensagem de Jesus de Nazaré nos desafiam a rever nosso compromisso social e político na construção da vida em nossas cidades. Para podermos ter cidades novas, é preciso um compromisso concreto com uma prática política na qual todos - sem exceção - estejam incluídos de forma responsável, participativa, solidária e fraterna.