segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

UM BANHO DE DEMOCRACIA: SEM RESSENTIMENTO, NEM RANCOR

Alexandre Aragão


Na tarde do dia 1º. de janeiro de 2011, não só uma multidão de brasileiros e brasileiras aguardavam alegremente a saída da presidenta Dilma Roussef da sua residência na Granja do Torto, em Brasília, para a cerimônia de posse. A Natureza, silenciosamente, também estava atenta para tão significativo momento, a fim de poder prestar também sua homenagem à primeira mulher a ocupar o mais alto posto da República Federativa do Brasil.

Tão logo o cortejo dos carros partiu em disparada rumo ao Congresso Nacional, caiu gratuitamente do céu uma emblemática chuva, banhando com suas águas cristalinas o início da nova etapa da democracia brasileira. A água, o elemento originário sem o qual a vida não pode existir, batizava com esplendor o novo tempo de nossa soberania popular.

Nada acontece por acaso, como afirmou Dilma em seu discurso de posse, “o que tem de ser, tem muita força”. E assim, a Natureza manifestou-se solenemente diante de um momento histórico do sonho democrático brasileiro em construção.

O ser humano não é só realização prática, mas também construção de sentidos pessoais e comuns. Coragem, invenção e ousadia, segundo Dilma, são elementos fundamentais para a afirmação coletiva de uma nação. Ou como diria Hélder Câmara, “sonho que se sonha só é só um sonho; mas quando se sonha juntos já é uma realidade”.

A democracia é definida, portanto, pela combinação do universo técnico com o universo simbólico, dos signos com os sentidos, do universal com o particular. Não é um simples conjunto de procedimentos, mas um trabalho de personalidades democráticas com o objetivo de manter a associação entre o mundo da ação e o mundo do ser, entre a vida comum e a vida individual, no reconhecimento pleno entre os muitos que convivem democraticamente.

Uma chave de leitura do sentimento de Dilma Roussef, contido em seu discurso de posse, é a valorização da vida, não como resultado de abstrações teóricas, mas a partir do sofrimento vivido com sua entrega, desde a juventude, ao sonho de construir um país mais justo e democrático, no momento em que as nuvens de nosso país “chupavam manchas torturadas”.

O sofrimento ensinou-lhe que não basta apenas a sensibilidade de sonhar, mas é preciso a coragem de enfrentar os desafios para tornar o sonho real. Ao haver suportado as adversidades mais extremas infligidas a todos os que ousaram enfrentar o arbítrio, ao ter de engolir o veneno do ódio e da opressão, ela pode gerar em si o antídoto capaz de superar tal escuridão. Nem o ressentimento, nem o rancor, mas o amor pela vida, por todas as vidas.

Como diz o poeta, "amar é ir além do fato, do contrato, penetrar no tempo inexato e inesperado, unir-se ao extremo separado, para pintar novos retratos".

Só o amor pela vida, por todas as vidas, é capaz de gerar o carinho e o cuidado que toda e qualquer democracia necessita para poder produzir contínua e dinamicamente o belo retrato da liberdade, da igualdade e fraternidade de um povo, de todos os povos.

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