quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Davos 2014 e o perigo da ampliação da desigualdade mundial



Alexandre Aragão de Albuquerque


Um comunicado da organização humanitária Oxfam, divulgado no dia 20 de janeiro, cita que metade da população mundial – cerca de 3,5 bilhões de pessoas – ganha, somadas suas rendas, o mesmo que as 85 pessoas mais ricas do mundo. Essa escandalosa desigualdade é tão acentuada que até a Cúpula dos Ricos reunida em Davos citou-a como uma das grandes ameaças à economia global. 

Contudo, simultaneamente, uma pesquisa promovida pela Pricewaterhouse Coopers, publicada dois dias depois, destacava que as mil multinacionais que financiaram a Cúpula de Davos defendem terminantemente a desregulação dos mercados e a redução dos déficits fiscais - ou seja, redução do investimento social dos governos nacionais, independente das necessidades de suas populações - como instrumentos fundamentais para lidar com os problemas econômicos globais. 

Em sua pesquisa a Oxfam assevera que em 24 dos 26 países mundiais que têm estatísticas dos últimos 30 anos, sete de cada dez pessoas no mundo vivem em lugar mais desigual. Além disso, os ricos têm uma forte e crescente influência sobre os processos políticos implicando problemas de legitimidade nas decisões de governos. 

Acontece que a crise de 2008 não foi causada pelos pobres, mas pelos ricos com sua especulação financeira. Como se sabe, os paraísos fiscais foram fundamentais nesta especulação, constituindo-se uma das chaves para o não financiamento dos Estados, forçando nestes a adoção de políticas de redução fiscal aos mais ricos para que eles não recorram à fuga de capital, inibindo a implantação de políticas sociais e econômicas que reduziriam a desigualdade. Desde a década de 1970, a carga tributária diminuiu para os ricos em 29 dos 30 países onde existem dados disponíveis. Esta é uma política impulsionada pelo crescente poder político dos ricos e pelo forte desequilíbrio em favor das corporações na distribuição dos lucros econômicos entre trabalhadores e o capital, com a queda do salário real médio. 

Marx já havia demonstrado que a livre concorrência gera a concentração da produção, e que a referida concentração, num certo grau do seu desenvolvimento, conduz ao monopólio. No início do século XX, os monopólios em importantes ramos da indústria como do petróleo, química, aço, carvão tomavam a forma de cartéis e de trustes: os cartéis estabeleciam entre si acordos sobre as condições de venda, os prazos de pagamento, repartindo os mercados de venda, fixando quantidades de produtos a fabricar, estabelecendo os preços e distribuindo os lucros entre si. Neste processo, os bancos transformaram-se de intermediários em monopolistas onipotentes, dispondo de quase todo o capital-dinheiro do conjunto dos capitalistas, bem como da maior parte dos meios de produção e das fontes de matérias-primas de muitos países. 

A concentração do capital financeiro e o aumento do movimento dos bancos provocou uma importante modificação na economia capitalista. Houve um estreitamento da relação dos bancos com a indústria e o comércio e, nessa relação, os bancos assumiram um papel de dominação sobre o resto da economia, subordinando as operações comerciais e industriais de toda a sociedade capitalista, colocando-se em condições primeiro de conhecer com exatidão a situação dos diferentes capitalistas, depois de controlá-los, exercer influência sobre eles mediante a ampliação ou a restrição do crédito, facilitando-o ou dificultando-o, e de decidir inteiramente sobre o seu destino, determinar a sua rentabilidade, privá-los de capital ou permitir-lhes aumentá-lo rapidamente e em grandes proporções. 

As “primaveras” promovidas pelas populações de várias partes do mundo são uma expressão clara de advertência do perigo que estamos correndo da ruptura do contrato social e da dissolução da ideia de cidadania perpetrada por essa política do dinheiro. É preciso haver um combate global contra a evasão fiscal e aos paraísos fiscais, juntamente com adoção de políticas sociais e econômicas que implementem a redução da desigualdade em escala planetária, para que possamos produzir verdadeiramente a sustentabilidade humana presente e futura.

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