segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Livres da fome!

Alexandre Aragão



Quando procuramos recepcionar amigos em nossas casas, a partilha do alimento apresenta-se como um importante gesto de apreço em nossa cultura, momento central do acolhimento. Em torno da mesa sentamo-nos para celebrar a alegria do encontro com o outro.
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Consumir o alimento não é um ato qualquer. Mais que uma necessidade básica, é um momento de comunhão sócio-cultural, porque, mesmo se sozinhos, sempre estamos em relação, alimentando-nos dos frutos da natureza e do trabalho humano.
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Como assinala o antropólogo Néstor Canclini, “não se trata de uma possessão individual, mas de uma apropriação em relações de comunhão”. Conseqüentemente, a fome a que estão submetidos milhões de pessoas no mundo denuncia a injustiça presente no sistema sócio-econômico global, num total desrespeito aos direitos humanos e ao princípio solidário da vida humana.
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O artigo 11 do Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Socais e Culturais reconhece o direito fundamental de toda pessoa de estar livre da fome e obriga os Estados-Parte a adotarem medidas e programas para atingir esse fim. Da mesma forma o Comentário Geral n. 12, do Alto Comissariado de Direitos Humanos das Nações Unidas (ONU), estabelece que o direito à alimentação adequada é de essencial importância para a fruição dos demais direitos. Trata-se de um direito universal e incondicional a ser garantido a todo e qualquer ser humano.
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No Brasil, a partir da iniciativa do sociólogo Herbert de Sousa [Betinho], com sua campanha de mobilização nacional denominada “Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida” - começou-se a introduzir uma política nacional de segurança alimentar com a criação do CONSEA, Conselho Nacional de Segurança Alimentar, buscando atender à determinação da Constituição de 1988, que enfatizou o reconhecimento dos direitos sociais e a necessidade de reverter a dívida secular da Nação com nossos irmãos empobrecidos.
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Em janeiro de 2004 foi criado o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, que tem por missão incrementar as ações governamentais voltadas para a inclusão social, onde se destaca o Bolsa Família que unificou diversos programas de transferência de renda anteriores. Essa unificação é muito importante, pois a centralização em um único programa evita a fragmentação e permite maior clareza em relação aos órgãos públicos responsáveis. A partir do conceito de segurança alimentar, introduziu-se no Brasil um mecanismo que permite aos sujeitos empobrecidos a não mais ter de vender sua força de trabalho no Mercado em troca do alimento. Com isso eles podem ir em busca de atividades que lhes possibilitem um ganho salarial maior, rompendo com o clientelismo secular em nossa estrututra sócio-econômica. Mas é preciso lembrar que existe ainda uma enorme população que deveria ser beneficiária, mas ainda não conseguiu ser contemplada. Isto precisa ser corrigido imediatamente, pois a fome fere a dignidade humana de forma implacável.
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Do ponto de vista operativo, o Poder Público municipal realiza o cadastramento dos beneficiários, cabendo à sociedade civil a responsabilidade de controlar a ação local através de conselhos ou comitês instalados pelas Prefeituras.
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Portanto, uma das tarefas fundamentais para nós da sociedade civil é a de ocuparmos nosso lugar como controladores do Bolsa Família, no sentido de garantir e ampliar o direito à alimentação adequada às pessoas que dele necessitam, de todas as faixas etárias, sem exceção, num processo de libertação da fome e de construção de uma nação solidária que garanta os direitos humanos básicos para todos.
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3 comentários:

  1. Caro Alexandre,

    Estudo do professor da FGV Marcelo Cortes Neri divulgado recentemente mostra que a crise não atingiu os mais pobres no Brasil, não lhes diminuiu a renda, não freou a queda da desigualdade e, o que mais impressiona, não impediu que as classes D e E continuassem encolhendo e que seus integrantes continuassem ascendendo à classe C mesmo no período negro de setembro, outubro, novembro e dezembro de 2008. O pesquisador atribui a programas sociais como o Bolsa Família e aos aumentos do salário mínimo os vastos sucessos sociais dos últimos anos do governo Lula, dando destaque para a queda da desigualdade e para o impressionante aumento de mais de 20% da classe C e o forte encolhimento do contingente de pobres e miseráveis nos últimos anos. Ele faz uma afirmação sobre o PAC, que todos os brasileiros precisam conhecer:

    "O PAC, Programação de Aceleração do Crescimento, é um plano que talvez não fizesse muito sentido quando ele foi lançado como um plano de aceleração do crescimento, porque a economia estava muito aquecida, e hoje em dia é visto quase como um New Deal americano [programa de aquecimento econômico do presidente americano Franklin D. Roosevelt implementado entre 1933 e 1937] numa época em que comparações com a grande depressão americana [de 1929] começam a se tornar mais comuns. Então, é meio como se o Brasil criasse um New Deal antes que a depressão fosse anunciada. Aqueles que acham que o Brasil estava com sorte, alguns anos atrás [conforme diz a imprensa e a oposição para desmerecer o crescimento continuado dos últimos anos], que sorte temos agora, porque é como se tivéssemos um bilhete de loteria, um seguro que não sabíamos que tínhamos (...)".

    É isso aí! Abração,

    Johnson

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  2. Obrigado, Johnson. O seu comentário só faz engrandecer a reflexão que estamos provocando.

    Valeu!

    Alexandre

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  3. A alegria foi grande em, além de encontrar Raoni, Paulo de Tarso, Olívia, Júnior, Rodrigo…constatar essa vida, comprometida com o projecto da Unidade, o nosso projecto, mas sobretudo passando pelo tecido social!

    Um grande abraço! Por aqui estamos a “manter a chama, juntos!” – onde constato sempre o quanto a espiritualidade da unidade é resposta às exigências deste “mundo”!



    Até mais, Carlos Leal - Lisboa - Portugal

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